O dia em que vivemos até aos 150 anos de idade

O dia em que vivemos até aos 150 anos de idade

David Sinclair é um famoso professor de genética que co-dirige o Paul F. Glenn Center for the Biology of Aging da Universidade de Harvard e que argumenta que, no final do século XXI, a esperança de vida poderá atingir 150 anos graças ao desenvolvimento de comprimidos concebidos para melhorar as nossas defesas contra as doenças e o declínio físico e cognitivo. “Como imagina esse mundo”, Sinclair foi questionado numa entrevista. “Imagino avós a jogar ténis com os seus netos e a serem membros ativos da sociedade, sem terem de passar os últimos anos das suas vidas em lares de idosos.

 

Para além das imagens idílicas ou enganosas – aquela “Disneylândia perpétua” que Antonio Diéguez, professor de Filosofia da Ciência, censura a uma parte da tecnociência – Sinclair é um tipo respeitável, com uma respeitável carreira científica. Os seus métodos de investigação, o tempo dirá, podem causar uma grande perturbação nos cuidados de saúde. Contudo, não há nada de original no seu objetivo, o que é, evidentemente, altamente louvável: história mostra-nos conclusivamente que estamos a viver mais e melhor a cada século. Em Espanha, por exemplo, a esperança de vida aumentou em 15 anos nas últimas quatro décadas de progresso. Um facto que nem mesmo os efeitos trágicos da pandemia podem refutar.

 

Talvez a grande diferença da era digital em relação a qualquer era anterior seja a velocidade a que a mudança está a ser trazida. A onda de inovação avançada no campo da saúde, associada a melhorias nas nossas dietas e estilos de vida, contribuem para esta equação: não sabemos se chegaremos aos 150 até ao final deste século, mas não é quixotesco dizer que, se conseguirmos resolver a emergência climática que nos espera, viveremos mais tempo e sofreremos menos.

E é aqui que, como sempre, surgem as questões: será possível adiar a idade da reforma numa sociedade robotizada onde a procura de mão-de-obra diminuirá significativamente? O que acontecerá às camadas da população que não podem aceder e beneficiar desta onda de inovação sanitária? Como serão resolvidos os desequilíbrios de poder entre gerações quando a maior parte do rendimento é controlada pelos maiores de 60 anos? Acabaremos – como argumenta o Professor Diéguez – por criar um fosso tão brutal onde as classes sociais são substituídas pelas classes biológicas? Embora estas questões permaneçam sem resposta, insistiremos nessa ideia que, poderíamos dizer, é o pano de fundo último da linha editorial da Ethic: o progresso, sem humanismo, nunca poderá ser chamado progresso.

Pablo Blázquez Director de la revista Ethic

Pablo Blázquez Director de la revista Ethic
Pablo Blázquez Director de la revista Ethic